14/09/2011

O transporte (público) precisa ser mais público

Por Samantha Buglione, no Jornal A Notícia
 
É com a chamada de um transporte público que realmente precisa ser público que a Udesc/Esag, em parceria com o Laboratório de Aprendizagem em Serviços Públicos da Esag, vai participar do Dia Mundial sem Carro, na próxima quinta-feira.
Pedestres e carros - disputa constante
A proposta da universidade é chamar atenção da comunidade sobre os problemas de mobilidade urbana. Poderíamos até dizer que essa é uma missão desnecessária, afinal, não conheço uma viva alma que já não tenha sofrido com a mobilidade urbana, seja com um ônibus que nunca vem ou uma linha que não existe, seja com engarrafamentos intermináveis.
A originalidade da proposta da Esag não está em mostrar o problema, mas que é possível ir e vir sem carro. Segundo os organizadores, a ideia é que os alunos e servidores da instituição utilizem o transporte coletivo, a bicicleta, a carona ou se desloquem a pé no dia 22 de setembro.
O Dia Mundial sem Carro, observa o professor Enio Spaniol, “é apenas uma data simbólica, pois deveríamos ter essa consciência de utilizar o transporte coletivo e outras maneiras de deslocamento, todos os dias”.
Mobilidade urbana está diretamente vinculada ao planejamento público e à garantia de direitos fundamentais da mais diversa ordem. Contudo, não é algo que dependa unilateralmente de uma política pública. Não podemos esquecer que as políticas de governo são sintomas da cultura. Uma sociedade que não valoriza o transporte coletivo e outros meios de locomoção (como bicicletas, caronas e andar a pé) não sente qualquer estranheza com o sistema limitado que tem à disposição. Às vezes, só viajando e experimentando outra lógica para que o absurdo do nosso dia a dia salte aos olhos. 

O transporte público, nas principais cidades brasileiras, não é uma alternativa de transporte, mas a única opção para quem não tem recurso para comprar um carro ou uma moto. Assim que sobrar alguns tostões no orçamento, o impulso será o de comprar um carro para si. É preciso, antes de qualquer coisa, encarar o transporte público como algo inteligente e bom. Para isso, o serviço oferecido deve ser de qualidade, mas, igualmente, as pessoas precisam redefinir o valor da coisa pública.

Roberto Da Mata mostra muito bem que no Brasil o público ou é coisa de ninguém ou de marginal: mulher da rua, menino de rua são exemplos emblemáticos de como se pensa a coisa pública por aqui (desviante, abandonada ou sem dono). Enquanto o público não for percebido como algo de todos, devendo, assim, estar sob o olhar cuidador de todos, vamos sofrer não apenas com a (des)mobilidade urbana, mas com os outros serviços também.
Por Samantha Buglione, no Jornal A Notícia (20/09/11)
bacharel e mestre em direito,
doutora em ciências humanas,
buglione@babele.com.br